Afinal Qual É a Melhor Dieta?

A resposta certa é… depende! Por mais que existam defensores acérrimos (com fervor religioso) de determinadas dietas, a verdade é que a dieta mais acertada depende de uma variedade de factores, tais como predisposição genética, sensibilidades alimentares, patologias clínicas, objetivos de curto/longo prazo e, não menos importante, prazer na degustação dos alimentos (comer sempre peixe cozido e couves de bruxelas também cansa).

Ainda assim, independentemente da dieta escolhida (ou a ausência de uma), existem certos princípios a seguir que, à luz do conhecimento científico actual, maximizam o bem estar e diminuem consideravelmente o risco de doença crónica.

Tipos de Dieta

Não há semana que passe sem que uma qualquer publicação (online ou “tradicional”) anuncie uma nova dieta que promete os mais variados benefícios. E o que ontem estava na moda, hoje já não serve, mas esta é que é a “tal”! No meio disto tudo o comum dos mortais fica cada vez mais confuso e sem saber no que acreditar. Vamos então tentar esclarecer algumas das dúvidas mais frequentes e dar algumas pistas sobre os hábitos alimentares mais saudáveis. Os tipos mais comuns de dieta são os seguintes:

  • Mediterrânica: esta dieta tem tido bastante tempo de antena, sobretudo pelos seus muitos alegados benefícios para a saúde. É necessário esclarecer que nem tudo o que se come em Portugal, Espanha ou Itália se classifica como dieta mediterrânica, por isso não vá já a correr comer pizzas, tapas e bife com batatas fritas. A dieta mediterrânica caracteriza-se pelo consumo de cereais integrais, frutas, legumes e vegetais, peixes gordos (sardinhas, anchovas, cavalas), carne em moderação (2 a 3 vezes por semana), gorduras saudáveis, tais como o azeite, frutos secos e abacate, muitas ervas aromáticas, tudo isto acompanhado esporadicamente por algumas bebidas alcoólicas (um copo de vinho tinto 3 vezes por semana). Além disso esta dieta deve estar incluída num estilo de vida que privilegia refeições em família e actividade física diária (originalmente trabalho no campo e percursos a pé em caminhos íngremes).

  • Keto (ou cetogénica): é uma dieta em que a maior parte das necessidades calóricas provêm de (boas) gorduras. Faz parte das chamadas dietas “low carb”, ou seja, do ponto de vista dos macronutrientes, 75% das calorias será assegurado pelo consumo de gorduras, 15% de proteína e 10% de hidratos de carbono. Estas percentagens podem variar, mas o princípio é restringir o consumo de hidratos a menos de 50g por dia, consumir proteína em moderação e garantir que mais do que 2/3 do aporte diário de calorias provém de boas gorduras. Esta regime alimentar pode ser muito interessante numa perspectiva de transformação corporal (diminuir peso e reduzir gordura), mas do ponto de vista da saúde não é sustentável a longo prazo. Deverá por isso ser intercalada com períodos de maior consumo de hidratos de carbono, 1 ou 2 dias por semana, no que se denomina dieta cetogénica cíclica.

  • Vegetariana: existem variantes a este tipo de dieta, consoante se permitam produtos lácteos e/ou ovos, dado que estes são de origem animal. O veganismo pode também ser uma filosofia de vida, renunciando a tudo o que seja derivado de animais e/ou lhes provoque sofrimento, do que são exemplos certos tipo de roupas (cabedal e peles) e alguns cosméticos ou produtos de beleza.

    Diversos estudos clínicos já demonstraram que o consumo de vegetais tem inúmeros benefícios do ponto de vista da saúde, que vão da prevenção de doenças crónicas até à diminuição de risco de contrair determinados tipos de cancro. Mas apesar destas vantagens, existem certos nutrientes que apenas estão disponíveis em derivados de animais, nomeadamente, vitamina B12, creatina, carnosina, taurina e DHA. Quer isto dizer que a dieta exclusivamente à base de plantas apenas é sustentável a longo prazo se incluir a suplementação destes nutrientes críticos para a saúde humana.

  • Paleolítica: consiste no regresso a hábitos alimentares e de vida mais próximos dos nossos ancestrais, baseia-se na suposta inadequação do nosso organismo às mudanças ocorridas na alimentação após o aparecimento da agricultura e da comida processada, que, numa perspectiva da evolução humana, não teve ainda tempo para a adaptação a esta nova realidade. Esta dieta inclui apenas alimentos possíveis de obter através da atividade do homem como caçador-recoletor, como são exemplos as carnes, peixes, frutos, hortícolas e sementes. São excluídos os produtos obtidos através da agricultura e da pecuária, como os produtos lácteos, legumes/leguminosas e cereais (trigo, milho, centeio, cevada, arroz, etc.). Existem algumas vantagens associadas à exclusão dos alimentos processados, ao aumento da ingestão de fibras, de ácidos gordos ómega-3, de vitaminas, minerais e antioxidantes, mas há um risco nutricional associado à exclusão dos lácteos e dos cereais, bem como um potencial excesso proteico e de gordura animal.

  • Carnívora: tal como o nome indica, baseia-se no consumo exclusivo de carne (e peixe), embora algumas variantes incluam pequenas doses de vegetais. Por forma a garantir o aporte de vitaminas e minerais essenciais é necessário o consumo de todo o animal, incluindo pele, orgãos e não apenas o músculo (o belo bife do lombo). Por incluir tão pouca (ou nenhuma) matéria vegetal, a dieta carnívora tende a ser pobre em vitaminas C e E e, se não houver laticínios, também em vitamina K2 e cálcio. Se não incluir o consumo de órgãos, também se torna baixa em vitamina A, folato, manganésio e magnésio, que são compostos cruciais para a função metabólica normal e saudável. Este tipo de dieta pode ser interessante a curto prazo para perder peso e regular o organismo, pois é na sua génese uma dieta de eliminação (comida processada e outros alimentos “suspeitos”), mas tudo aponta para que não seja sustentável de forma contínua.

Princípios Gerais a Seguir

Com ou sem rótulo, existe um conjunto de regras (e bom senso) a seguir no regime alimentar que é o melhor garante para um vida longa e saudável:

1. Evitar comida processada.aqui se referiu os benefícios de consumir comida “verdadeira”, ou seja, que não tenha passado por um processo de transformação. Uma regra simples a seguir é evitar tudo o que tenha uma lista de ingredientes. Nesta categoria de produtos processados a evitar também se incluem carne de produção intensiva e peixe de aquicultura.

2. Reduzir a proteína de origem animal. Regra geral, um adulto necessita cerca de 0,8g de proteína por cada kg de peso. Quer isto dizer que uma pessoa de 70kg de peso precisa consumir diariamente 56g de proteína, o que pode ser obtido num bife ou filete de peixe com cerca de 200g. Mas a proteína não existe apenas em derivados animais. Leguminosas, grãos, laticínios e frutos secos são igualmente fontes de proteína. Alguns estudos associam o consumo excessivo de carnes vermelhas a uma maior incidència de doenças cardiovasculares, diabetes e certos tipos de cancro. Um exemplo de plano semanal ideal teria 3 refeições de carne (vaca, porco, borrego, aves), 4 de peixe e as restantes à base de proteína vegetal (lentilhas, grão-de-bico, quinoa, ervilhas, sementes de cânhamo, feijão).

3. Variedade. Existem cerca de 50.000 variedades de plantas comestíveis, mas 90% do consumo mundial resume-se a apenas 15. Milho, trigo e arroz representam 60%. Para garantir as necessidades de nutrientes essenciais é importante diversificar ao máximo o consumo de produtos alimentares. E isto é verdade para os de origem vegetal, mas também para os de origem animal: o fígado de vitela é um campeão dos nutrientes, fornece vitamina do complexo B, vitamina A, ferro, zinco e cobre. Tente por isso diversificar ao máximo a sua lista de compras de frutos, vegetais, leguminosas e tipos de carne e peixe.

4. Pense no meio ambiente. Prefira produtos locais e de época. Reduza o consumo de carne (70% da água potável mundial é utilizada na criação de gado). Se possível compre a pequenos produtores com práticas agro-pecuárias sustentáveis.

5. Qualidade em vez de quantidade. Começando pela quantidade, deve-se evitar comer até ficar cheio, para isso é essencial comer devagar e mastigar bem a comida. Os habitantes de Okinawa no Japão, uma das zonas com mais centenários, seguem o princípio do hari hachi bu, que se traduz em parar de comer quando se sentem 80% cheios.

No que respeita à qualidade deve-se dar preferència a produtos orgânicos e evitar alimentos geneticamente modificados (soja importada dos EUA), potencialmente contaminados com pesticidas (produtos agrícolas tratados com glifosato) ou metais pesados, tais como os peixes altos em mercúrio: peixe espada, atum. O consumo de carnes processadas deve ser reduzido, uma vez que está associado a uma maior taxa de mortalidade.

6. Termos como “sem açucar”, “sem gluten” ou “0% gordura” não significam sempre as escolhas mais saudáveis. A verdade é que estes rótulos mascaram muitas vezes um rol de ingredientes pouco recomendáveis. Leia com atenção a lista de ingredientes e faça uma escolha ponderada. Na dúvida, se não reconhecer determinado ingrediente, é melhor deixar o produto na prateleira do supermercado.

7. Tenha atenção às sensibilidades alimentares. Não, não tem de abolir o consumo de gluten e lactose… ou será que tem? Na verdade cerca de 20% da população tem algum tipo de intolerância alimentar. Os 3 alimentos com mais testes positivos são os lacticínios (principalmente de vaca), gluten (pão, massas e cereais em geral) e ovos. Teste o que resulta consigo. Se possível, faça um diário do que comeu para poder mapear possíveis sintomas (enfartamento, gases, má disposição) com determinados alimentos, uma vez que os sintomas podem aparecer até 72h depois do respectivo consumo. Uma sensibilidade alimentar é diferente de uma intolerância/alergia (ver figura abaixo), na medida que não existe uma reação tão intensa, mas a longo prazo pode ter efeitos nefastos para a saúde.

8. Use e abuse das especiarias e ervas aromáticas. Oregãos, salsa, coentros, tomilho, louro, manjericão, rosmaninho, canela, açafrão, alhos, cebola e muitos outros. Atualmente existem amplas evidências de que as especiarias e as ervas aromáticas possuem propriedades antioxidantes, anti-inflamatórias, anticarcinogênicas e redutoras do açucar e colesterol no sangue, além de afetarem positivamente a cognição e o humor. Já agora, nesta categoria dos temperos, o sal marinho é muito saudável, o problema do consumo excessivo de sal tem sobretudo a ver com a sua grande incidência alimentos processados (onde se inclui o pão).

9. Modo de preparação da comida. A forma como cozinhamos os alimentos tem um impacto nos respectivos nutrientes, que tanto pode ser positivo (facilitando a absorção), como negativo (destruindo vitaminas e minerais). Evite submeter os alimentos a temperaturas superiores a 140ºC, e reduza (elimine!) a utilização de óleos vegetais (margarinas, amendoim, milho, girassol, etc.). Dê preferência a gorduras que tenham um ponto de fumo elevado, tipicamente as que estão no estado sólido à temperatura ambiente: óleo de coco e manteiga. O azeite também é uma boa escolha.

10. Um prato equilibrado e colorido. Por esta altura já deve ter percebido que não existe o conceito do universalmente ótimo. Em Portugal a DGS publicou a Roda dos Alimentos, que representa a proporção dos vários grupos alimentares a consumir diariamente. Por exemplo, fruta e vegetais deve representar entre 7 a 9 porções diárias (cerca de 400gr). A Universidade de Harvard disponibilizou o conceito do “prato saudável” (figura abaixo), que é muito fácil de seguir: metade fruta e vegetais, um quarto de cereais integrais e um quarto de proteína.

11. Mantenha-se hidratado. Devemos ingerir cerca de 3,5L de água por dia, a maior parte provém da comida, sobram cerca de 1,5 a 2L, que equivalem a 10 copos de água. As bebidas alcoólicas não contam para estes números, tente reduzir o seu consumo a 3 copos por semana (vinho tinto preferencialmente). As diversas variedades de chá e o café (em moderação) são bebidas permitidas, uma vez que se já se demonstraram os seus muitos benefícios para a saúde humana.

12. Não comer. Sim, é verdade, o jejum intermitente tem inúmeros benefícios comprovados. que vão do controlo de peso, aumento da longevidade e à diminuição de risco de contrair uma doença crónica. Se possível, e se não tiver nenhuma condição médica que o impeça, tente garantir um período diário de 12h sem ingestão de alimentos (por exemplo se jantar às 20:00, tome o pequeno almoço após as 8:00 da manhã).

E pronto, seguir esta dúzia de regras é bem mais impactante do que dar um rótulo a um qualquer regime alimentar. É sobretudo importante ter presente os benefícios, os resultados pretendidos e os desafios de cada tipo de dieta, adaptando cada uma às suas necessidades. Mais do que a forma, é essencial garantir a qualidade da “matéria prima”, a alimentação constitui a base de uma vida saudável. Tal como disse Hipócrates, o pai da medicina, “que o teu alimento seja o teu remédio, que o teu remédio seja o teu alimento”.

Rui Silva